Nos casos da ivermectina e a nitazoxanida, dois vermífugos, que foram defendidos e tiveram o uso estimulado por Jair Bolsonaro, o ministério da Defesa informou em umas das reuniões realizadas pelo CCOP (Centro de Coordenação das Operações do Comitê de Crise da Covid-19), em 3 de julho de 2020, que estava em curso um “conflito de interesses entre as fabricantes relacionadas aos vermífugos Anitta [nitazoxanida] e Ivermectina”.
Segundo o Ministério da Defesa, ambos os remédios têm a mesma função. O problema, segundo a Defesa, “é que o fármaco Anitta precisa de receituário médico e a Ivermectina está sendo vendida sem o receituário. Proibiram a venda sem receita médica somente do fármaco Anitta”.
Ambas as medicações não estiveram na categoria de medicamentos de controle especial durante toda a pandemia. A nitazoxanida (Anitta) entrou para o grupo de controle especial em abril de 2020 e a ivermectina em julho de 2020.
Em seguida, em agosto, o presidente Bolsonaro afirmou nas suas redes sociais que a Anvisa iria facilitar o acesso à ivermectina e que a população poderia comprar o medicamento “com uma receita simples”, o que se concretizou em setembro, quando a ivermectina e a nitazoxanida foram excluídas da classificação da Anvisa de controle especial, permitindo o reaproveitamento da receita e a compra de mais remédios sem a necessidade de uma nova prescrição, o que resolveu o problema do conflito de interesse citado na reunião da CCOP.
Em outra reunião do CCOP, em 21 de outubro de 2020, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), comandado por Marcos Pontes (atualmente senador pelo PL) informou por meio do seu representante que o MCTI realizou “coletiva de imprensa para promover o estudo clínico ‘Terapia precoce da Nitazoxanida em pacientes com Covid-19’, conhecido também como Annita, que tem a capacidade de reduzir a carga viral do coronavírus”.
A ata indica um link para uma matéria do Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que não está mais disponível, mas que diz que “Estudos comprovam que o vermífugo anitta é eficaz no combate a covid-19”, o que nunca foi provado, ou seja, se trata de uma fake news.
Durante a CPI da Pandemia, senadores acusaram empresas de lucrar milhões de reais com a venda de ivermectina, “à custa de milhares de vidas perdidas para a Covid-19”.
Durante depoimento à CPI em agosto de 2021, Jailton Batista, diretor-executivo da empresa Vitamedic, que produz ivermectina, admitiu que a venda da ivermectina saltou de 2 milhões de unidades de quatro comprimidos em 2019 para 62 milhões em 2020. Somente com a ivermectina, a empresa faturou R$ 15,7 milhões em 2019, número que passou a R$470 milhões em 2020.
No Brasil, a Vitamedic é um dos principais produtores do medicamento, também vendido por outros laboratórios, como Abbott, Legrand e Neo Química. O nome das empresas, no entanto, não é citado nas atas obtidas pela reportagem que sugerem o “conflito de interesse”.
Recentemente, um estudo global publicado na prestigiada revista científica Nature, que ouviu pessoas de 23 países, entre eles o Brasil, mostrou que a ivermectina, ineficaz e contraindicada para o tratamento da covid-19, foi tomada por 79,5% dos participantes brasileiros que tiveram a doença. O levantamento foi conduzido pelo Instituto Global de Saúde de Barcelona (ISGlobal) e ouviu 1 mil participantes de cada um dos países que fizeram parte da amostra.