É uma situação francamente ridícula. Proibidos de divulgar que as eleições de primeiro turno foram absolutamente limpas, os militares viram-se obrigados a inventar a desculpa andrajosa de que o seu trabalho ainda não havia sido concluído. Diante disso, o Tribunal de Contas da União deu um prazo de 15 dias para que o relatório das Forças Armadas seja entregue.
Quem já acompanhava os meus artigos, antes de eu vir para o Metrópoles, sabe que nunca acreditei em golpe. Não há condições objetivas nem razões subjetivas para que os granadeiros deem ouvidos às poucas vivandeiras alvoroçadas que foram bulir com eles nos seus bivaques. Jair Bolsonaro e os seus acólitos tentaram, mas não levaram.
A saída dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, em março de 2021, depois da demissão do então ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, foi um gesto forte de que a caserna não se meteria em aventuras golpistas. Os seus substitutos, embora mais afinados ideologicamente com Jair Bolsonaro, também estabeleceram uma linha da qual não passariam. Tanto é que, em setembro do ano passado, conforme apurado por mim na ocasião, deram um rotundo não à sugestão do presidente da República de tomar o poder e interromper a democracia brasileira. O desfile de tanques fumacentos em Brasília nada significou para as Forças Armadas, além de mostrar o quanto estão mal equipadas.
De lá para cá, os militares continuam a cumprir as determinações que lhes chegam, mas sempre dentro dos limites previstos pela Constituição. A questão é que a Constituição não previu um presidente como Jair Bolsonaro, que é também o comandante supremo das Forças Armadas, assim como também não levantou a hipótese de os militares um dia serem convidados a fiscalizar eleições.
Se o comandante supremo das Forças Armadas dá uma ordem que não contraria expressamente a Constituição, os militares não têm como desobedecer. É evidente que Jair Bolsonaro quer manter engatilhado o discurso de que uma eventual derrota para Lula foi causada por fraude. Mas isso não tira a caserna da posição de xeque institucional em que Jair Bolsonaro os colocou. Para divulgar o seu relatório sobre a ausência de irrregularidades no primeiro turno, é preciso que haja uma contraordem que socorra os granadeiros. Talvez a do TCU seja suficiente. A alegação do subprocurador junto ao tribunal é que “a Constituição Federal admite sigilo em raras hipóteses, uma delas quando a informação seja imprescindível à segurança do Estado, e, neste caso, é a segurança do Estado que sairá fortalecida com a divulgação de tais informações”. Esperemos que a coisa não vá parar no STF, o que poderia criar mais fricção entre o Executivo e o Judiciário. Esperemos também que nunca mais alguém tenha a ideia brilhante de chamar militar para fiscalizar eleição.