Rafaela Felicciano/Metrópoles A alta cúpula do Exército entregou os pontos e não tem a menor expectativa de refazer os laços com os ministros Edson Fachin, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Luís Roberto Barroso, seu antecessor. O plano dos generais, agora, é esperar Alexandre de Moraes assumir o comando da Corte, daqui a dois meses e meio, para tentar restabelecer a relação. O relacionamento entre o TSE e a cúpula militar se tornou um elemento importante para o processo eleitoral deste ano em razão das ameaças do presidente Jair Bolsonaro de não reconhecer o resultado das urnas em caso de derrota. Sem apoio do alto comando das Forças Armadas, Bolsonaro dificilmente terá condições de aplicar um golpe e permanecer no poder.
Com Barroso e Fachin, o canal do Exército ficou interditado após os dois ministros criticarem a atuação dos militares na comissão criada no TSE para atestar a transparência do processo eleitoral e a segurança das urnas eletrônicas.
A iniciativa, adotada por Barroso no período em que presidiu o TSE, tinha por objetivo blindar o tribunal e o sistema de votação dos ataques de Jair Bolsonaro – que, sem apresentar provas, levanta dúvidas sistematicamente sobre a segurança do processo.
Ao convidar representantes das Forças Armadas para a Comissão de Transparência das Eleições (CTE), Barroso pretendia neutralizar a ofensiva de Bolsonaro, uma vez que o presidente dificilmente se insurgiria contra um sistema chancelado pelos militares, nos quais diz confiar.
Ocorre que, uma vez dentro da comissão, os oficiais apresentaram questionamentos sobre as urnas eletrônicas que, logo depois, passaram a ser usadas politicamente pelo presidente da República.
Para integrantes da cúpula do Judiciário, a ideia de Barroso de convidar os militares acabou por se transformar em um “tiro no pé”.
A crise com a cúpula militar teve seu ápice quando o próprio ministro declarou que as Forças Armadas estavam sendo usadas “para atacar o processo eleitoral”. Edson Fachin, seu sucessor no comando do TSE, fez coro e, em duro recado aos generais, disse que quem trata de eleições são as “forças desarmadas”.
Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal - Metrópoles. Alexandre de Moraes, nascido em 1968, é doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), professor, advogado, ex-promotor de justiça, ex-ministro da justiça e ex-político brasileiro. Natural de São Paulo, foi indicado ao Supremo Tribunal Federal pelo ex-presidente Michel Temer, em 2017
Moraes assume o comando do TSE em agosto e será o xerife das eleições deste ano Sobreveio, então, um estremecimento que há tempos não se via entre o Judiciário e o comando militar. As Forças Armadas seguem representadas na comissão, mas o clima é o pior possível.
Em privado, oficiais com trânsito livre nos mais importantes gabinetes do quartel-general do Exército disseram à coluna que, neste momento, a corporação não tem qualquer expectativa de pacificar a relação com o TSE.
Para esses mesmos militares, Barroso e Fachin atacaram o Exército como instituição. Eles rechaçam, evidentemente, a leitura de que os oficiais destacados para integrar a comissão estão sendo manietados pelo Palácio do Planalto e sustentam que as questões enviadas têm caráter estritamente técnico.
Para a alta cúpula do Exército, o único movimento capaz de reverter o quadro de rompimento seria uma espécie de “pedido de desculpas” por parte dos dois ministros, o que não parece estar no horizonte neste momento – nem os próprios generais acreditam nessa possibilidade.
E aí entra o detalhe mais interessante. Os militares dizem que vão esperar Alexandre de Moraes assumir o comando do TSE, em agosto, para dar início ao processo de reconstrução da relação com o tribunal. Moraes será o presidente da Corte nas eleições.
O plano dos generais chega a ser irônico para quem acompanha o xadrez de Brasília: acusados de agir em favor de Bolsonaro, eles depositam as esperanças de normalização das relações com o TSE justamente no ministro que é tido pelo presidente como seu maior inimigo no topo do Poder Judiciário.
Relator de investigações que miram Jair Bolsonaro e seus aliados no Supremo, como o inquérito das fake news e o das milícias digitais, Moraes é detestado pelo presidente, que já o chamou publicamente de “canalha”.
A aposta na reconciliação a partir da troca no comando do tribunal, porém, faz sentido. À diferença de Barroso e Fachin, Alexandre de Moraes mantém excelente relacionamento com oficiais do alto comando do Exército. Um sinal disso está nas condecorações que ele já recebeu.
Já como ministro do STF, em abril de 2016 o ministro foi agraciado com a Ordem do Mérito Militar e, em 2018, ganhou o grau de Grande Oficial.
Antes, quando ainda era secretário estadual de Segurança Pública de São Paulo, Moraes fora homenageado com outra das grandes honrarias do Exército, a Medalha do Pacificador. Um título bastante apropriado para as circunstâncias — ou não, a depender do que virá nos próximos meses.