Ao menos um prefeito que precisou lidar com um dos pastores contou que, para ter a vida facilitada no MEC, era exigido o pagamento de propina. No caso, um quilo de ouro. Foi o que disse ao jornal O Estado de S.Paulo o prefeito de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB). O pedido teria ocorrido em um restaurante em Brasília.
As negociações à luz do dia ocorrem em um contexto de cortes e total ausência de política pública séria para o setor.
Com próceres de sua guerra ideológica instalados na pasta desde o início da gestão, Jair Bolsonaro transformou a Educação em uma trincheira por onde jorram recursos para alimentar a sua base. Uma base alinhada nas fronteiras borradas entre igreja e Estado.
A suspeita causou estupefação a quem acompanha já estupefato o desmanche das políticas educacionais no país. Em nota, a ONG Todos Pela Educação afirma que, se a denúncia for comprovada, “trata-se de um acontecimento de enorme gravidade em ao menos três dimensões: ética, de gestão e legal”.
“É um ultraje que recursos educacionais tão necessários para a Educação, profundamente impactada por quase dois anos de fechamento das escolas durante a pandemia, sejam utilizados indevidamente, servindo a objetivos eleitoreiros do presidente da República”, diz a entidade, que defende a apuração do caso pelo Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República.
Pastor presbiteriano, Milton Ribeiro já estava na mira da bancada evangélica, formada por lideranças de diversas denominações (como as neopentecostais) por supostamente beneficiar os amigos em sua agenda. A suspeita acelerou o processo de fritura. Ribeiro é hoje um ministro tóxico do qual líderes religiosos querem distância —seja por oportunismo, seja por cuidado.
Ele corre o risco de se tornar o terceiro ministro ejetado do cargo em quatro anos de mandato.
Só que o escândalo dessa vez respinga em gotas graúdas sobre Bolsonaro, a quem o ministro atribui o pedido de beneficiar os pastores Airton Moura e Gilmar Santos. Para quem prometia acabar com o toma-lá-dá-cá ao assumir o governo, a suspeita de tráfico de influência em uma pasta-chave da administração tem tudo para cair como uma bomba.
No Twitter, o caso já ganhou o nome de "Bolsolão do MEC".
O caso se junta às suspeitas de que havia no governo quem tentou ganhar por fora na negociação para compra de vacinas no auge da pandemia. O caso esfriou desde o fim da CPI da Covid, mas tem tudo para voltar à vitrine da campanha eleitoral.
Bolsonaro insiste em dizer que em quase três anos e meio não houve casos de corrupção em seu governo. É que, para sua turma, corrupção é só o que acontece no quintal vizinho.
A poucos meses da eleição, ele vai precisar explicar como permitiu tal estado de deterioração da coisa pública a ponto de dois pastores sem cargo pudessem falar em nome do governo –e conseguido a liberação de recursos prometidos a troco de sabe-se-lá o quê.
O trabalho agora, para seus adversários, é apurar se esse dinheiro ao menos foi aplicado para os projetos apresentados aos pastores que azeitavam o atalho. Se ficar comprovado que a liberação de recursos ocorria mediante pagamento aos supostos lobistas, Bolsonaro chega à campanha com um grande escândalo para chamar de seu. Mesmo que demita o ministro e finja que não tinha nada com isso.
A suspeita acontece no momento em que o presidente é acusado de improbidade administrativa pelo Ministério Público por ter supostamente mantido uma funcionária fantasma em seu gabinete quando era deputado federal. Wal do Açaí trabalhava como comerciante no horário do expediente.
Bolsonaro jamais conseguiu provar que ela de fato atuava como assessora parlamentar. É bom lavar as mãos se quiser mesmo colocar o tema corrupção no centro da conversa durante a campanha.