O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), impôs nesta quarta-feira, 25, uma derrota política ao presidente Jair Bolsonaro e rejeitou o pedido do mandatário para que a Casa instaurasse um processo de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. No início do mês, a Câmara já havia barrado outra intenção do presidente: a de retomada do voto impresso.
“Quero crer que essa decisão possa constituir um marco de reestabelecimento das relações entre os Poderes, pacificação e união nacional”, disse Pacheco ao ler o arquivamento do pedido no plenário do Senado, nesta quarta-feira. “Além do lado técnico, há também o lado político de uma oportunidade para reestabelecer a boa relação entre os Poderes”, emendou.
No final de semana, houve uma reação grande contra o pedido de afastamento do ministro do STF. Dez partidos de centro e esquerda e dez ex-ministros da Justiça divulgaram notas contra o ato de Jair Bolsonaro.
O pedido de impeachment foi assinado pelo próprio Bolsonaro, o que é incomum, com direito a firma reconhecida em cartório. No texto, Bolsonaro argumenta que o Poder Judiciário passou a agir como um ator político. Por isso, deveria tolerar ataques similares aos que ele diz sofrer enquanto presidente. O presidente também questiona decisões tomadas por Moraes em julgamentos do Supremo. A Constituição estabelece que os ministros não podem ser condenados pelos votos que proferem.
Moraes se tornou um alvo de Bolsonaro por conduzir o inquérito das fake news , que tem como foco a fabricação e o financiamento de informações contra adversários do presidente. No documento em que pede o impeachment do ministro, o presidente justificou que o Moraes desrespeitou as liberdades individuais quando determinou, por exemplo, a prisão do presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson.
Aliado de Bolsonaro, Jefferson foi preso por integrar o “núcleo político” de uma rede que age para “desestabilizar as instituições republicanas”, no entender de Alexandre de Moraes. Para isto, o deputado utilizaria uma “rede virtual de apoiadores” devotados a espalhar mensagens que pedem a “derrubada da estrutura democrática e o Estado de Direito no Brasil”.
Na epígrafe do pedido, Bolsonaro colocou um trecho da fala de Alexandre de Moraes em sua sabatina no Senado, em 21 de fevereiro de 2017, quando o ministro disse reafirmar sua “devoção com as liberdades individuais” – as quais, no entender do presidente da República, o ministro atacou.
O pedido em si soma 17 páginas, mas o arquivo protocolado no Senado é bem maior, pois inclui cópias de documentos pessoais de Bolsonaro e alguns despachos de Alexandre de Moraes. “Faço um apelo a Vossa Excelência para que priorize sua atenção aos atentados à liberdade de expressão e às liberdades públicas de cidadãos e cidadãs em todo o País, que vêm sofrendo ataques aos direitos constitucionais fundamentais da livre manifestação do pensamento”, escreveu o presidente da República.
“Não se pode tolerar medidas e decisões excepcionais de um Ministro do Supremo Tribunal Federal que, a pretexto de proteger o direito, vem ruindo com os pilares do Estado Democrático de Direito. Ele prometeu a essa Casa e ao povo brasileiro proteger as liberdades individuais, mas vem, na prática, censurando jornalistas e cometendo abusos contra o Presidente da República e contra cidadãos que vem (sic) tendo seus bens apreendido e suas liberdades de expressão e de pensamento tolhidas”, diz o texto.
No sábado, 21, Bolsonaro argumentou que o pedido era uma “revanche”. “Eu fiz tudo dentro das quatro linhas da Constituição. Engraçado, quando eu entro com uma ação no Senado fundada na Constituição, o mundo cai na minha cabeça. Quando uma pessoa, com um inquérito do fim do mundo, me bota lá, ninguém fala nada. Não é revanche, cada um tem que saber o seu lugar. Só podemos viver em paz e harmonia se cada um respeitar o próximo e saber que existe um limite, que é a nossa Constituição”, afirmou.
O ato de Bolsonaro contra Moraes é um gesto político inusual. A última vez que um presidente da República atuou para afastar ministros do STF se deu durante a ditadura militar (1964-1985). O então presidente, o general Costa e Silva, decretou em 1969 a aposentadoria compulsória dos ministros Evandro Lins, Hermes Lima e Victor Nunes Leal — este último se tornou conhecido como autor do livro Coronelismo, enxada e voto (1948). Em protesto, outros dois ministros do STF renunciaram aos mandatos: Gonçalves de Oliveira e Antonio Carlos Lafayette de Andrada.