O ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, obrigou um soldado negro de 19 anos a puxar uma carroça e carregar outro militar em cima. O episódio aconteceu em 2005, quando o general comandava o quartel do Depósito Central de Munições do Exército, em Paracambi (RJ). Na ocasião, a 1ª Região Militar resolveu abrir um Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar a conduta do oficial.
De acordo com o Estadão, que conversou Carlos Vítor de Souza Chagas, recruta que foi obrigado a substituir um cavalo, Pazuello teria visto os dois soldados passarem em uma carroça. No entanto, ele teria julgado que os homens estavam "rápido demais" e, por este motivo, resolveu dar uma "lição".
Gargalhando, Pazuello mandou os dois pararem, desatrelar o animal e ordenou que Carlos puxasse a carroça com o outro soldado em cima. "Eu não estava pilotando o cavalo, estava na carroça. Quem estava era o outro garoto", disse ao Estadão.
Hoje com 35 anos, Carlos ainda se lembra do episódio que viveu. Ele contou ao jornal que tinha sido convocado por um outro tenente para ajudar a carregar uma banheira na carroça. O ex-soldado diz acreditar que a decisão do ex-ministro de Jair Bolsonaro (sem partido) se trata de racismo.
“Pelo meu tio, eu botava para frente [denunciaria o crime de racismo na Justiça], mas eu dei mais ouvido ao meu pai, que é evangélico, por medo de represália. Isso aí agora está nas mãos de Deus, Ele é o Senhor de todas as coisas", disse Carlos.
Pelo ocorrido, Pazuello chegou a ser investigado pelo Exército. Na época, a 1ª Região Militar resolveu pela abertura do Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar a conduta do oficial.
Segundo o Estadão, que acessou o documento, o inquérito concluiu que Pazuello quis "orientar" o soldado “para a preservação da boa saúde dos cavalos de tração utilizados na OM (organização militar)”.
No Inquérito Policial Militar do caso, o outro soldado que estava na carroça, Celso Tiago da Silva Gonçalveso, disse que estava com o ombro machucado e por isso “não poderia cumprir a ordem de puxar a carroça”.
Procurado, o advogado do general, Zoser Hardman, não respondeu à reportagem.
Na quarta-feira (26), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid decidiu reconvocar o general da ativa Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, para prestar um novo depoimento.
No primeiro depoimento, realizado nos dias 19 e 20 de maio, as falas de Pazuello reuniram uma série de tentativas de blindar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de redistribuir a responsabilidade pelo fracasso sanitário do Brasil para além do Ministério da Saúde.
Pazuello, que comandou a Saúde de maio de 2020 a março de 2021, foi o auxiliar que passou mais tempo na pasta durante a pandemia de covid. Mas foi acusado por senadores de omitir fatos importantes sobre a gestão e faltar com a verdade.
O relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), apontou 15 mentiras ou contradições nas falas do ex-ministro de Jair Bolsonaro. Testemunhas, como foi o caso de Pazuello, têm a obrigação de falar a verdade à CPI.
"Ele [Pazuello] estava com um habeas corpus debaixo do braço, que permitia que ele falasse o que ele quisesse, que nada poderia acontecer com ele. Por isso que ele está sendo reconvocado, vai ser reconvocado na quarta-feira”, afirmou o senador ao Grupo Prerrogativas.
O general tinha um habeas corpus, concedido pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que lhe garantia, entre outros pontos, o direito de permanecer calado diante de perguntas que pudessem o incriminar, sem ser constrangido com ameaças de prisão.
Para o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão, o salvo conduto deu a Pazuello o direito de mentir impunemente e não deve ser dado novamente.
Dias depois da passagem pela comissão, o ex-ministro da Saúde ainda acompanhou Bolsonaro, num evento de motociclistas que causou grande aglomeração no Rio de Janeiro. Eles não usaram máscaras.
No último domingo (30), Bolsonaro disse ao comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que não quer ver o ex-ministro Eduardo Pazuello punido por participar de um ato em favor do presidente no Rio de Janeiro, há uma semana.
A proteção sugerida por Bolsonaro a Pazuello amplia a crise entre a Presidência e o Planalto. Segundo reportagem do jornal Folha de S.Paulo, o ato do ex-ministro da Saúde gerou irritação no Alto-Comando do Exército, colegiado de 15 generais de quatro estrelas encabeçado por Paulo Sérgio.