Faço isso desde que cheguei a Brasília, quando ainda existia o Serviço Nacional de Informação, o célebre SNI, sobre o qual seu fundador, o general Golbery do Couto e Silva, uma vez disse:
“Criei um monstro”.
Não comparo a Abin ao SNI. Os tempos mudaram. Por mais de 21 anos, o SNI foi o mais poderoso serviço de informações e contra informações da ditadura militar de 64. Podia tudo. A Abin, não.
O último general-presidente da ditadura, João Baptista de Oliveira Figueiredo, foi chefe do SNI. O SNI esteve por trás de operações de repressão no Brasil e em países da América Latina.
A ditadura acabou em 1985 com a eleição do presidente Tancredo Neves e a posse do vice José Sarney, e o SNI só foi extinto cinco anos depois por decisão do presidente Fernando Collor.
A Abin está para o SNI como um gato estaria para um Rottweiler Cabeça de Touro. Visitei sua sede em 2004, quando seu chefe decidiu mostrar a um grupo de jornalistas como ela funcionava.
À entrada havia uma placa: “Sorria, você está sendo filmado”. Fomos admitidos em todas as salas (ou quase todas). E saímos de lá com um brinde: a ficha de cada um feita pelo SNI.
Tenho a minha emoldurada para celebrar os erros do SNI, tido como infalível. Ali, Ora fui ligado a uma organização de esquerda, ora a outra. Assinei manifestos que nunca assinei.
Só há registro na ficha da primeira das quatro vezes que fui preso – no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) de 1968, realizado em Ibiúna, interior de São Paulo.
Éramos mais de 800 estudantes de todos os Estados reunidos à céu aberto, debaixo de chuva, imaginando que não seríamos descobertos. Fomos todos, amanhã completa 55 anos.
Levados para o Presídio Tiradentes, fichados pelo DOPS de São Paulo (Departamento de Ordem Política e Social), mais tarde fomos devolvidos aos nossos Estados.
Das fichas do SNI, saltamos como se fôssemos heróis para um monumento erguido em Ibiúna, onde constam os nossos nomes. As voltas que o mundo dá.