Houve 1,3 milhão de novos casos registrados na semana até o dia 19, uma alta de 7% em relação à semana anterior e o terceiro salto seguido. Não é que a imunização tenha fracassado: a eficácia da vacina não está em impedir a transmissão, mas em reduzir hospitalizações e mortes.
A Europa, porém, também é o continente que está vendo mais gente morrer de Covid a cada semana, e não é simples explicar por quê, principalmente quando a média europeia encobre disparidades. A pandemia está ganhando volume em 35 dos 61 países e territórios acompanhados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o que quer dizer que não está nos outros 26.
A amplitude da imunização também varia, o que não necessariamente implica um controle maior dos óbitos. Estão totalmente vacinados 86% dos belgas, mas apenas 16% dos ucranianos, duas populações em que a taxa de mortes cresce há quatro semanas seguidas, embora seja relativamente baixa (menos de 90/1 milhão de habitantes).
"Estamos claramente em uma quarta onda", declarou o ministro da saúde da Bélgica, Frank Vandenbroucke, para quem o "grande aumento nas infecções deve ser seguido por uma alta nas internações hospitalares".
Na Ucrânia o número de novos casos e mortes bateu um recorde desde o começo da pandemia, em 2020. Não deixa de ser um sinal de que o país conseguiu segurar a onda quando grande parte do mundo entrava em colapso, mas mostra que agora a maré parece ter mudado. E eis o segundo motivo pelo qual é enganador olhar para a Europa como se fosse um território uniforme: em cada um de seus mais de 40 países, regras de controle da pandemia -e a adesão da população a elas- mudam muito.
A Ucrânia, por exemplo, tornou obrigatório o comprovante de vacinação para frequentar vários lugares, mas o efeito foi dúbio: fez crescer também a compra de certificados falsos, a ponto de justificar uma reunião emergencial convocada pela presidência. Trabalhadores em 15 hospitais são investigados pela polícia.
"Existem apenas dois caminhos: vacinação ou confinamento", disse o presidente Volodimir Zelenski. Mas na prática a pandemia no continente está mostrando que um caminho não exclui o outro. O ministro belga pediu ao governo que volte a adotar a exigência de máscaras faciais em espaços públicos e torne obrigatório o trabalho em casa em todas as regiões do país.
Se a Bélgica seguir o conselho, não será a primeira. A Letônia, que já vacinou 56% da população, reimpôs medidas na semana passada para tentar frear a alta tanto de contágio quanto de mortes. Poucos dias depois, a Rússia também fechou os escritórios para conter um pico de óbitos: em uma semana, 6.897 sucumbiram à Covid, 1 em cada 4 mortos no continente.
"Nosso sistema de saúde está em perigo", afirmou o primeiro-ministro letão, Arturs Krisjanis Karins, puxando uma fila de declarações semelhantes, nem sempre emitidas pelos governantes.No Reino Unido -um dos líderes globais na vacinação-, foi o chefe da Confederação do NHS (sistema público de saúde), Matthew Taylor.
"Estamos no limite. Será preciso uma quantidade incrível de sorte para não nos encontrarmos no meio de uma crise profunda nos próximos três meses", disse ele, pedindo novas restrições.
O número de novos casos no Reino Unido é de fato alto e está em ascendente. Mas os dados mais recentes de internações diárias e ocupação hospitalar não refletem uma crise, e o de mortes também não acelerou, o que, segundo o governo britânico, respalda a decisão de não decretar novas restrições.
Por enquanto, essa é a opinião também da OMS: "O caso do Reino Unido é particularmente instrutivo de como as vacinas desassociam a curva de contágio da de doenças graves e mortes", afirmou na quinta (20) o diretor-adjunto da organização, Michael Ryan.
Ele diz que um crescimento nas infecções é esperado durante o inverno do hemisfério norte, porque as pessoas ficam mais tempo em ambientes mal ventilados. Se o que faz diferença é a vacinação, segundo Ryan, nações ricas precisam ceder doses às mais pobres, para elevar a proteção em todo o globo.
Mas mesmo países com altas taxas de vacinação devem ter planos de contingência, até porque surtos de gripe podem surpreender. "A porcentagem de imunizados não é o mais importante; o crucial é que idosos e doentes recebam todas as doses."
No caso do Reino Unido, há também o risco de que, justamente por ter iniciado antes sua campanha de vacinação, o país esteja chegando antes a um momento em que a proteção dos imunizantes começou a baixar, afirmou o ex-conselheiro do governo Neil Ferguson, do Imperial College de Londres. Isso indica a necessidade de novas doses de reforço, de acordo com ele.
Espetar a agulha nos braços da população não tem sido tarefa fácil em alguns dos países europeus. Na Eslováquia, hospitais já começaram a cancelar cirurgias porque estão ficando lotados de pacientes de Covid, dos quais três quartos não tomaram a vacina. Na região autônoma de Zilina, ataques de "antivaxxers" atrapalharam tanto a vacinação que o governo teve que suspender a divulgação das rotas da equipe móvel.
Já na Itália, onde só é possível trabalhar com o certificado de imunidade, a procura de trabalhadores pelos postos de saúde aumentou, de acordo com o governo. A meta italiana é chegar ao final deste mês com 90% da população imunizada: na semana passada, estava em cerca de 80%. Para a alta na procura contribuiu o fato de os testes deixarem de ser gratuitos para não vacinados.
Entre os italianos que cederam agora às injeções estão trabalhadores que não são antivaxxers, mas não se sentiam seguros em relação às doses anti-Covid. "Estava com medo de efeitos colaterais, e houve todos esses protestos. Mas preciso trabalhar e não quero continuar gastando dinheiro em testes", disse ao jornal britânico Guardian uma atendente de supermercado de 59 anos.
Na vizinha Áustria, o governo anunciou na noite de sexta que pretende ir pela mesma trilha e impor restrições aos não vacinados. "Estamos prestes a cair em uma pandemia de não vacinados", disse o premiê Alexander Schallenberg. Uma ordem de ficar em casa será decretada se pacientes de Covid ocuparem um terço dos leitos de UTI do país. A ocupação na sexta era de 25%.
O caso mais grave em todo o continente europeu é o da Romênia, que registrou 226 mortes por 1 milhão de habitantes nas duas semanas encerradas na quinta (21), a maior taxa entre os europeus.Com contágio em alta há quatro semanas, a situação foi chamada de "alarmante" pelo presidente Klaus Iohannis, que acenou com novo confinamento e disse que a quarta onda de coronavírus pode levar a um drama nacional.